Mesmo sendo parte fundamental da Superliga, os clubes que participam da maior competição do país querem mais. O desejo de uma maior participação não acontece por acaso, a partir do momento em que se vê tanta coisa que pode ser melhorada, esbarrando nas decisões da Confederação Brasileira de Vôlei (CBV), responsável por organizar o campeonato brasileiro. A falta de iniciativa para que uma evolução contínua seja mais efetiva incomoda e fez com que os times e jogadores se unissem, em 2014, para criar a Associação de Clubes de Vôlei (ACV).
A ideia era criar uma entidade para reunir forças em busca de melhorias em vários níveis. Após o ‘barulho’ feito com a criação, criando uma expectativa de mudanças em curto prazo, é somente agora em 2017 que novidades são vislumbradas. “Após a criação, passamos por trâmites burocráticos. Foi um período de muitas conversas entre os clubes, um processo de maturação. Ganhamos força neste meio tempo”, comenta Eduardo Carreiro, gerente de esportes do Sesi-SP, um dos oito times que fazem parte. Vôlei Brasil Kirin-SP, Minas Tênis Clube, Caramuru Castro-PR e São Bernardo não fazem parte da entidade no atual momento.
Representantes estiveram juntos em São Paulo, há algumas semanas, acertando detalhes para que a associação saísse do papel. A presidência é de Vittorio Medioli, que ocupa o mesmo cargo no Sada Cruzeiro. “Se for necessário fazer um contrato ou convênio amanhã, temos legitimidade para tal. Agora estamos regularizados com CNPJ e todas as outras exigências”, comemora Flávio Pereira, diretor esportivo do Sada Cruzeiro. “Não queremos tomar o lugar de federações ou confederações. Queremos apenas que os clubes sejam ouvidos e respeitados, tendo uma maior participação nos seus interesses”, completa.
A ideia é colocar os times na linha de frente, dando a eles maior poder de decisão nas negociações e nos retornos que uma competição como a Superliga oferece. “Queremos potencializar as opções, fazer um modelo que dê mais importância aos clubes, que possa aumentar seu poder de captação”, indica Andrey Souza, gestor do MOC Vôlei.
“Os clubes cobram maior participação nas decisões e novas fontes de receitas para se manter em alto nível. A ACV nasce de uma necessidade de sobrevivência e de fortalecimento. Os clubes precisam de fontes de receitas que apenas um esforço conjunto poderá conseguir”, afirma Vittorio Medioli.
Necessária abertura
Por maior que sejam os desencontros de opiniões em relação à CBV, a ideia da associação passa por uma parceria. A união destas forças pode trazer muito mais benefícios ao vôlei brasileiro como um todo do que uma ação de rompimento.
“O objetivo a curto prazo é nos aproximarmos da CBV e nos organizarmos internamente, buscando fontes de receita para começar o planejamento. Queremos fortalecer o vôlei brasileiro e tornar os clubes sustentáveis, por meio de uma melhor distribuição dos recursos”, indica Carneiro. Nunca na história da Superliga, os clubes receberam valores de premiação da CBV. “Sempre tem algo que pode ser melhor explorado. Queremos atingir o potencial de uma liga valorizada, com retorno financeiro, que atraia patrocinadores para que existam prêmios e cotas de participações. A CBV usaria seu tempo e sua energia para as seleções, deixando os clubes por conta destas negociações”, reforça Flávio.
Para isso, é preciso que a CBV entenda os motivos que fizeram a ACV ser criada e os benefícios que podem acontecer para que um trabalho em conjunto possa explorar toda a potencialidade do vôlei brasileiro. Procurada, a CBV afirmou que está aberta ao diálogo. Se, até hoje, com todos os anos de Superliga, muitas mudanças não aconteceram, é por algum motivo.
Independentemente de quais sejam eles, o importante, neste momento, é olhar adiante e reconhecer quais melhorias estão ao alcance. Sozinho dificilmente conquistas aparecerão, dentro e fora de quadra e o passado recente parece ter apontado nesta direção. “Acredito que essa abertura por parte deles vai existir. Os tempos estão maduros e o que valeu no passado hoje não se sustenta. Da Superliga podem surgir uma receita de mais de R$ 20 milhões com uma razoável organização. A CBV também tem a ganhar com isso e creio que encontraremos um termo de convivência sem partir para uma Superliga independente”, destaca Medioli.
Para Andrey Souza, do MOC, o momento favorece a parceria. “A realidade econômica do país não é positiva e isso deixa as entidades mais fragilizadas. Dentro disso, queremos uma aliança para potencializar os dois lados, fazer algo que seja bom para todos. Não teríamos motivos para excluir a CBV de tudo isso, mas um novo modelo é necessário. A ideia não é brigar e sim construir algo melhor para os clubes”, mostra.
Novo olhar
Entre as iniciativas da associação, está uma visita à Itália, em breve, para ver de perto o funcionamento, a organização e a estrutura da liga local, uma das melhores do mundo. Por lá, o que não faltam são exemplos que poderiam ser incorporados à realidade brasileira, como video-check, exploração comercial de patrocínios nas quadras e ginásios lotados, impulsionados por uma cultura do vôlei enraizada em várias cidades. Municípios como Piacenza e Milão contam com equipes no principal torneio do país há décadas, apoiados pela prefeitura, por empresas e por uma torcida cativante, que acompanha o time há muitos anos.
A área de atuação da ACV iria abranger diversos períodos da carreira do atleta, desde sua formação, até a passagem pela seleção, chegando a aposentadoria. “Os clubes, atualmente, não são recompensados quando algum dos seus atletas é convocado. Se essa recompensa aparece, fica mais fácil fazer um planejamento justo para que ele sirva o país durante aquele período. Sabemos que o atleta recebe para servir a seleção, mas sua principal receita vem dos clubes, por onde eles jogam a maior parte da temporada. Também temos preocupação com a formação dos atletas. São os clubes os responsáveis por garimpar os atletas para que eles se desenvolvam e cheguem à seleção. Quem molda e forma são os clubes e o vôlei só consegue crescer através deles”, indica Pereira.
“Nos sentimos aptos para defender os clubes. Sabemos que temos muito a contribuir. Uma coisa é um clube ir conversar sozinho com a CBV e outra é uma associação aparecer defendendo o interesse de quase todos eles. Estamos com a expectativa de, em breve, fazer uma apresentação formal à CBV. O melhor momento, no entanto, não é agora, com a temporada em andamento”, sugere o diretor.
De fora
De todos os participantes da Superliga masculina, apenas São Bernardo Vôlei-SP, Caramuru Castro-PR, Minas Tênis Clube e Vôlei Brasil Kirin-SP são os únicos que não fazem parte da ACV. O time de Campinas não vê necessidade de sua participação, apesar de elogiar a iniciativa.
“Sempre que precisamos, fomos direto na CBV. Temos um contato aberto lá e achamos que temos voz suficiente dentro da entidade. Não vejo necessidade da nossa participação neste momento”, comenta o supervisor André Heller. “A associação é bacana, mas preferimos defender nosso posicionamento de forma direta. De toda forma, entendo a mobilização dos clubes no sentido de buscar uma parceria e uma melhor organização”, revela.