Escritor de Luminárias lança livro no fim de semana

agosto 16, 2017

Um carro de boi, casinhas de alpendre, portas destrancadas e meia dúzia de aposentados jogado dama na pracinha, ao redor de um coreto. Imagens que veem à nossa cabeça, quando nos lembramos das inúmeras cidades do interior de Minas Gerais. Estereótipo de uma vida tranquila, é nessa paisagem bucólica que se pensa, ao dizer – cansado do trânsito e da vida dura das grandes cidades –”vou mudar para o interior, quero paz e sossego”.

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Mas os seis contos que compõe o livro Paisagem Interior (Editora Penalux, 2017, 110 páginas), afastam-se desses lugares-comuns. O interior retratado na obra é hostil e complexo, e foge muito do paraíso bucólico dos anúncios turísticos. Talvez porque esse interior, como uma espécie de paraíso perdido, não exista mais. Nem na realidade, nem nos livros.


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Interior na Literatura Brasileira
Não é preciso ir muito longe. Mesmo uma pesquisa mais superficial sobre a ficção contemporânea publicada nos últimos anos, certamente revelaria que a grande maioria das personagens e espaços representados na nova Literatura Brasileira está restrita ao universo das metrópoles e dos grandes centros urbanos. O interior, em certa medida, quase que desapareceu da literatura.
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O motivo disso talvez seja a própria dinâmica da realidade. O crescimento das cidades, a formação das megalópoles. Mas, apesar disso, ainda resiste um núcleo contraditório, um espaço ao mesmo tempo arcaico e moderno, que subsiste espalhado pelo país. É desse universo em ruínas que a coletânea de contos Paisagem Interior se nutre. De partida, esse é um dos méritos do livro.

“A ficção de Marcos Vinícius Almeida atinge seus pontos mais altos justamente quando mergulha nesses interiores periféricos e despedaçados”, afirma o escritor e doutor em Teoria Literária pela PUCRS, Luís Roberto Amabile, que assina o posfácio. “Embora inspirado em mestres como Luiz Vilela e Oswaldo França Jr., o Marcos tem uma voz muito própria e seus contos são muito bem arquitetados”.

O interior que o livro revela – sempre num jogo de ambiguidade entre interno e externo, pois o interior aqui pode ser o íntimo das personagens, mas também a paisagem interiorana – escapada da visão romantizada desses espaços onde a classe média costuma ir visitar os avós. É um universo duro, contra o qual as personagens se debatem.

“Interessante é notar que o título bem expressa o movimento presente nas narrativas”, explica a poeta e professora do programa de pós-graduação em Literatura e Crítica, da PUCSP, Annita Costa Malufe, “os lugares por elas trazidos, mais do que simples cenários externos, são reveladores de qualquer coisa de interior, de interno, aos personagens.”

Desterro
Marcos Vinícius Almeida é jornalista e faz mestrado em Literatura. Ele nasceu em Taboão da Serra, na grande São Paulo, mas cresceu e se criou em Luminárias, uma cidade de cerca de seis mil habitantes, que fica no sul de Minas Gerais.
É dessa vivência no interior que vem parte da inspiração das personagens. “Eu sempre me senti meio deslocado lá. É uma coisa meio ambígua. Quando criança, uns amigos sempre diziam: ‘você não é daqui’. E não era mesmo. De certa forma, nunca fui completamente integrado. Ao contrário deles, cujas famílias eram gigantescas, com avós, pencas de primos, meu núcleo familiar sempre foi restrito à minha casa”, diz o escritor, que hoje vive na capital paulista.
“Mas também só fui conhecer a cidade que nasci, Taboão da Serra, já beirando os trinta. O que sempre me deixou numa posição de estrangeiro desterrado, sem lugar de origem. Talvez daí venha uma sensação de olhar as coisas sempre à certa distância. E talvez por isso me sinta mais ou menos bem em São Paulo. Todo mundo em São Paulo tem um pé, um antepassado, uma raizinha que seja, que escapou de outro lugar”.

Fonte: Lincoln Souza

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