A privatização da Fernão Dias (BR-381) completa 10 anos em 2018. E se nesse período a rodovia recebeu investimentos, cresceu e se tornou uma das mais importantes rotas comerciais do Brasil, por outro lado, ainda registra em média 20 acidentes por dia de acordo com a própria administradora da estrada. Com o dever de reduzir os índices pela metade até 2020 – e ainda muito distante dessa meta -, a concessionária diz apostar em ações contra a imprudência dos motoristas.
A rodovia, que liga os estados de São Paulo e Minas, foi inaugurada no final da década de 1950 pelo então presidente Juscelino Kubitschek, passou por um leilão na segunda metade dos anos 2000 e, por meio de uma concessão à Autopista Fernão Dias, passou para as mãos do grupo Arteris S/A, que administra ao todo 3,2 mil km de pistas em todo o país.
A Fernão Dias é o trecho da BR-381 que liga as regiões metropolitanas de São Paulo e Belo Horizonte. Com início em Guarulhos e final em Contagem, a via, que hoje opera integralmente de forma privatizada, passa por 33 municípios ao longo de 570 km, 17 deles no Sul de Minas. Segundo a Arteris, em média 200 mil veículos passam pela rodovia todos os dias.
Segundo o diretor superintendente da Arteris, Helvécio Tamm de Lima Filho, a principal busca da empresa após a privatização tem sido manter a circulação destes veículos sem grandes paradas ou congestionamentos.
“Um conceito de concessão que eu acho muito bacana é dar fluidez. É deixar as pessoas trafegarem de acordo com as condições normais da rodovia”, afirma. “Então nós temos que fazer qualquer e toda atividade para que a pessoa que saia de Belo Horizonte e chegue a São Paulo não se depare com rodovia interditada, com transtornos”, exemplifica o diretor.
O contrato de concessão traz um programa de investimentos a ser cumprido e abre margem para que a concessionária também proponha obras de melhoramento nas rodovias – isso além da obrigatoriedade de manter o pavimento em boas condições segundo normas do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit). A Arteris diz já ter investido R$ 2,166 bilhões em obras na Fernão Dias.
O valor, segundo eles, é diluído em todo o percurso, com obras de implantação de trevos e alças de acesso e aumento de vias em determinados trechos. Além disso, de acordo com a empresa, foram instaladas 53 passarelas para pedestres e pontos operacionais que oferecem apoio para os usuários da rodovia.
Acidentes
Desde a privatização, o trecho apresentou diminuição das mortes, mas em um ritmo abaixo do esperado pela Arteris, que “assumiu o compromisso de reduzir pela metade o número de óbitos na rodovia até 2020”, segundo nota da própria concessionária.
De acordo com os dados da empresa, com base nessa proposta, o número de mortes caiu de 195 em 2013, para 156 em 2017. Ou seja, uma redução de 20%. No mesmo período, o número de acidentes caiu de 9.478 para 8.104, o que representa uma diminuição de 14,5%.
“As pessoas costumam falar que a Fernão Dias é uma rodovia perigosa. Eu discordo. Ela não é uma rodovia perigosa. Porque se as pessoas respeitassem a sinalização, respeitassem todas as orientações dadas pela concessionária, por tudo que tem implantado na rodovia, a gente possivelmente teria uma quantidade de acidentes bem menor”, lamenta o diretor Lima Filho.
Para o caminhoneiro Vardecir Eggert, que é de Santa Catarina e dirige pela Fernão Dias há mais de 15 anos, a rodovia melhorou após a duplicação, concluída em 2005, e passou a ser mais segura para trafegar após a privatização.
“Está 100% melhor do que era antes, porque antes, de Três Corações a Perdões, era só buraco. E muita curva, muito acidente”, fiz Eggert.
O motorista, no entanto, diz que nem tudo é perfeito e o asfalto precisa ser melhor cuidado, já que as operações ‘tapa-buracos’ não fazem um recapeamento completo dos trechos.
“Às vezes fico duas, três semanas puxando direto [pelo Sul de Minas]. Poderia [melhorar] os consertos da pista, que eles estão fazendo. Está ficando muito ondulado, daí dá muito soco no caminhão. Seria o mais necessário”, completa.
O também caminhoneiro João Pedro Tavares faz coro ao colega. “Tem uns lugares que está meio precário, que está pior do que estrada de chão”.
Já o valor do pedágio foi considerado justo pelos motoristas. O comerciante Paulo Siqueira de Souza conta que viaja muito para São Paulo e que costuma pagar mais nas rodovias do estado.
“Aqui em Minas a gente consegue gastar um pouco menos, então tem um lucro maior. Quando a gente precisa ir para o litoral [paulista], o custo do serviço fica maior”, explica.
O motorista Carlos Alberto José da Rocha, de Curitiba, conta que faz o trajeto há 15 anos e que gosta de viajar pela região.
“Os pedágios aqui são bons, são baratos. Para nós, lá do Paraná, é muito caro o pedágio lá. Então é bom de andar aqui. Se você quebrar, é mais rápido o socorro, para atender a gente. Então até que eu gosto muito de viajar para cá. Prefiro mais fazer Belo Horizonte do que viajar pelo Paraná”, afirma.
Questionada sobre as condições do asfalto, a Autopista Fernão Dias afirmou que “realiza a conservação de toda extensão” e que “equipes especializadas trabalham diariamente na identificação e manutenção de danos no pavimento. A empresa diz ainda que as “manutenções obedecem aos padrões técnicos vigentes no país e normas estipuladas no contrato de concessão”.
Tudo isso, claro, tem um custo. E ele vem diretamente para quem passa pela rodovia por meio das praças de pedágio. São oito ao todo, distribuídas pelos 570 km administrados pela concessionária. Em todas elas, a tabela atual de preços é a seguinte:
Pedágio na Fernão Dias
Segundo Bruno Batista, que é diretor executivo da Confederação Nacional do Transporte (CNT), o preço cobrado em que cada rodovia privatizada é definido de acordo com a contrato estabelecido entre o poder público e a empresa privada.
“Isso vai refletir a diversidade de modelos e os modelos que foram adotados pelo poder público. Então alguns modelos são mais favoráveis, outros menos favoráveis, com compromissos diversos entre eles”
O diretor, no entanto alerta para a necessidade de fiscalização a fim de que o serviço tenha a qualidade e execute as obras propostas no contrato.
“Duas situações têm que ser verificadas: quais foram os prazos previstos no edital e no contrato com essas empresas para que as intervenções sejam feitas; e a importância do papel fiscalizador do Estado. Se não tiver uma cobrança e uma verificação daquilo que foi previsto no contrato, isso também tende a provocar uma situação desvantajosa para o usuário e também para o transportador”, afirma Batista.
Monitoramento
Para manter toda essa estrutura e acompanhar o desenvolvimento do tráfego, a empresa conta com o Centro de Controle Operacional (CCO), localizado na sede da Arteris em Pouso Alegre (MG).
No centro, profissionais treinados vigiam dia e noite as 223 câmeras espalhadas pela empresa na rodovia. É de lá que saem as informações para as equipes, distribuídas em 13 bases operacionais, possam atender prontamente os usuários.
“Esse trabalho é feito 24h por dia. Hoje a gente dividiu a rodovia, para efeito de controle, em três segmentos próximos de 200 km. Então estas câmeras estão o tempo todo focadas. Elas têm algumas movimentações automáticas, outras que são feitas pelos próprios operadores. E elas nos ajudam. Muitas vezes, o próprio funcionário do CCO já identifica um acidente, o veículo parado. Então isso é a forma que a gente tem de estar próximo o dia inteiro na rodovia”, explica Lima Filho.
Mas as câmeras não são os únicos olhos da concessionária na rodovia. Equipes em viaturas circulam pelos trechos para que fazer esse acompanhamento. Além disso, os próprios funcionários das empresa que passam pela Fernão Dias também são orientados a acionar o controle operacional caso notem alguma anormalidade.
“Então hoje a gente tem as inspeções de tráfego, que rodam 24 horas. Nós temos outros veículos administrativos. Todo mundo que trabalha na empresa e anda na rodovia está sempre atento para que caso se depare com uma situação fora da normalidade, comunique ao nosso 0800 para que então o CCO entre em atuação”, diz o diretor.
Por fim, os operadores acompanham também as redes sociais em busca de reclamações ou postagens sobre trechos defeituosos. Caso uma notificação surja, as câmeras são direcionadas para o setor para apurar o ocorrido.
Auxílio e socorro
Uma vez detectado um problema, o socorro terrestre é acionado. A concessionária diz disponibilizar 23 guinchos, 15 viaturas de inspeção, 18 veículos de resgate, sendo seis com estrutura de UTI móvel, 3 veículos de combate ao incêndio, 3 caminhões operacionais e 3 carretas de apreensão de animais.
“Eu sou da época que quando a gente chegava em um acidente, a nossa obrigação era colocar a vítima dentro do carro e levar para o hospital o mais rápido possível. Hoje a gente sabe que não é o procedimento correto. Quer dizer, o correto é acalmar a vítima e aguardar que que o recurso chegue.E aí entra nossa obrigação, que é a estabilização da vítima”, afirma Lima Filho.
Os veículos de resgate são distribuídos em trechos de aproximadamente 30 km, mas, geralmente, dois são acionados simultaneamente para atender a mesma ocorrência, buscando garantir a segurança dos envolvidos.
“A experiência tem nos mostrado que 90-95% dos acidentes, as vítimas têm ferimentos leves, moderados ou estão ilesas. E em 3-4%, há a necessidade de intervenção médica no local”, diz o diretor.